"Ficou olhando o quadro de Edward Hopper ali na sua frente, Night life e descobriu pasmada que nunca esse quadro teve tanta significação como nessa noite. O limpo e banal café de esquina de uma rua vazia de Nova York, o café quase vazio (só três pessoas no balcão) com o empregado de uniforme branco-azulado lavando coisas debaixo da torneira, xícaras? A longa fila dos banquinhos vazios contornando o balcão, tudo visto do lado de fora, através da comprida vitrine de vidro. O silêncio sem moscas. O vidro sem poeira.
E esse quadro estranhíssimo de um café noturno em alguma esquina de algum beco em Nova York. Havia vermelho mas nesse café até a cor vermelha era fria. A solidão medíocre."
Telles, Lygia Fagundes - As Horas Nuas