sábado, 11 de junho de 2011

Lua crescente em Amsterdan


(...)

- Você disse que seria a menina mais feliz do mundo quando pisasse comigo em Amsterdã.

- Tenho ódio de Amsterdã. Eu era tão perfumada, tão limpa. Me sujei com você.

- Nos sujamos quando acabou o amor. Agora vem, vamos dormir naquele banco. Vem, Ana.

Ela puxou-lhe a barba.

- Quando foi que fiquei assim tão imunda, fala!

- Mas eu já disse, quando deixou de me amar.

- Mas você também - ela soqueou-lhe fracamente o peito. - Nega que você também...

- Sim, nós dois. A queda dos anjos, não tem um livro? Ah, que diferença faz. Vem.

- O banco é frio.

Quando ele a tomou pela cintura, chegou a se assustar um pouco: era como se estivesse carregando uma criança, precisamente aquela menininha que fugira há pouco com seu pedaço de bolo. Quis se comover. E descobriu que se inquietara mais com o susto da menina do que com o corpo que agora carregava como se carrega uma empoeirada boneca de vitrina, sem saber o que fazer com ela. Depositou-a no banco e sentou-se ao lado. Contudo, era lua crescente. E estavam em Amsterdâ. Abriu os braços. Tão oco. Leve. Poderia sair voando pelo jardim, pela cidade. Só o coração pesando - não era estranho? De onde vinha esse peso? Das lembranças? Pior do que a ausência do amor, a memória.

(...)


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